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Os bancos, o risco e a difícil arte de emprestar para os pobres

por: Afonso Bazolli
em: Crédito
fonte: Valor Econômico
20 de setembro de 2017 - 18:07

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Por Adriana Cotias

No caixa da padaria, um plástico roxo entregue para pagar as compras chama a atenção da atendente. Ela pergunta ao cliente se é aquele cartão “que faz tudo pela internet”. O jovem rapaz explica que sim, que um aplicativo dá até a localização aonde ele fez os gastos, que não há cobrança de anuidade e que conseguiu um limite três vezes maior do que o que tinha antes no cartão Submarino, de R$ 1 mil. Pela forma ou conteúdo, o estranho nome Nubank está na boca do povo. A fila de espera de 70 mil consumidores para ter o meio de pagamento na carteira mostra o potencial de iniciativas baseadas em alta tecnologia como essa. E as limitações de escala também.

Se tal frente de negócios vai cumprir o papel de incluir financeiramente um contingente de pessoas ainda fora do atendimento bancário tradicional, o tempo dirá. Mas a experiência recente mostra como é difícil a arte de emprestar para os pobres.

Grandes nomes do varejo bancário ensaiaram estratégias nesse segmento e derraparam. Uma das mais recentes, que ainda vai se provar, é a da Caixa Econômica Federal que dá a opção para que famílias inscritas no Bolsa Família recebam o benefício mensal com o cartão da bandeira Elo, atrelado a uma conta poupança.

Nas métricas de bancarização, o Brasil teve avanços importantes. Dados do Banco Mundial apontam que 68% da população tem conta em banco, em comparação a 43% na média dos países em desenvolvimento. Mas ter conta corrente não significa ter acesso a uma ampla gama de serviços financeiros, como crédito, cartões de pagamento e seguros. Nada garante que o cartão Elo não será usado para um único saque do dinheiro do Bolsa Família na lotérica mais próxima. É com desconfiança que a baixa renda também enxerga os bancos, porque esse público nunca se sentiu acolhido pelo setor financeiro.

A Serasa Experian estima em R$ 58,3 bilhões a soma de crédito que deixou de ser negativado em São Paulo neste ano em decorrência da lei paulista que passou a exigir que devedores sejam notificados por carta assinada antes de ter os nomes incluídos na lista negra. A iniciativa que se espalha por outros Estados brasileiros torna o trabalho de avaliação de risco de bancos, financeiras e varejistas ainda mais árduo. Tem o potencial de retardar a já lenta inclusão financeira das camadas de menor renda.

Nos tempos de bonança da economia, e do crédito, no início dos anos 2000, grandes nomes do varejo bancário empenharam-se em avançar nas operações de crédito ao consumo. Houve uma rodada de consolidação, com aquisições ruidosas como a da Losango pelo HSBC, Zogbi e Finasa pelo Bradesco ou o então Unibanco adquirindo o cartão Hipercard e formando alianças com redes como Magazine Luiza e Ponto Frio. O americano Citigroup trouxe para o Brasil a sua marca de financiamento ao consumo, a Citifinancial, e o Itaú selou um sem número de parcerias no varejo, caso do Pão de Açúcar, pagando pedágios milionários pelo uso do balcão do lojista, além de estrear na oferta de crédito na rua, com a financeira Taí.

As cenas de promotores laçando o consumidor em vias apinhadas no centro velho de São Paulo, Rio, ou Recife ficaram para trás. E das iniciativas daqueles anos frutíferos só alguns modelos sobreviveram. Tal trajetória mostra que mesmo os nomes mais tarimbados do setor financeiro não conseguiram refinar seus sistemas de avaliação de risco para emprestar a quem tem o orçamento mais apertado.

Questões estruturais como altas taxas de juros e renda per capta baixa dificultam essa tarefa. A central de risco de crédito do Banco Central, que permite ver a situação de operações a partir de R$ 1 mil, é uma ferramenta poderosa de análise para o sistema financeiro, mas os dados têm defasagem de um mês e no ciclo econômico atual há pouca disposição dos bancos para emprestar e das pessoas físicas para buscar crédito. A base do BC não é acessível, porém, a empresas não financeiras. Sem o apoio dos birôs, mais complexa é a aprovação fora do escopo bancário, hoje apegado a mitigadores de risco.

O crédito consignado para servidores públicos, aposentados e pensionistas do INSS, por exemplo, segmento para o qual os bancões torciam o nariz no início por conta do baixo spread, avançou a passos largos e atualmente reúne R$ 258,9 bilhões, soma construída em pouco mais de uma década. A garantia do desconto em folha de pagamento promoveu a modalidade a segmento “core”. Agora o governo acena com a possibilidade de uso do FGTS para assegurar operações de trabalhadores da iniciativa privada – que nesse mesmo intervalo acumularam créditos de R$ 18,5 bilhões. Em caso de perda do emprego, a totalidade da rescisão pode ser usada para quitar o empréstimo. Surge aí mais uma muleta, um novo redutor de risco, que pouco deve fazer no quesito inclusão financeira.

Mesmo no financiamento de veículos, cuja garantia real já foi cantada como uma das benesses do segmento, provou-se insuficiente. Os incentivos a entradas pequenas e parcelamentos em até 60 meses converteu-se em forte inadimplência. Os atrasos chegaram a superar os 7% das carteiras, ante os atuais 4,4%. A depreciação do bem, os altos custos de retomada e de revenda deixaram um gosto amargo para o setor financeiro que ainda depura esses portfólios.

Novas ferramentas de avaliação de risco com o uso de mídias sociais ou informações de consumo no comércio eletrônico podem compor os modelos de avaliação de novatas como o Nubank. Em seu site, a empresa explica que “a pontuação mínima para ter o cadastro aprovado pode mudar de acordo com os perfis que solicitaram o cartão no mesmo período. Além disso, novas informações e fontes de dados são incluídas constantemente em nossos modelos de análise, podendo influenciar essa pontuação”.

Pesquisa global da PWC estima que “startups” de serviços financeiros podem tomar em média 23% dos negócios das instituições financeiras em cinco anos. No Brasil, onde os quatro maiores bancos detêm 74,5% do crédito, talvez esse avanço demore um pouco mais.

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