Imprimir Artigo

Imprimir

O mosaico da terceirização

Por: Afonso Bazolli
Em: Notícias
Fonte: Consumidor Moderno

O-mosaico-da-terceirizacao-televendas-cobranca

Em meio à discussão sobre as novas propostas de regulamentação do setor, players apresentam argumentos sobre os possíveis impactos na economia

São muitas as variáveis, assim como o número de colaboradores envolvidos em cada operação. O recurso do outsourcing – ou terceirização, como é chamado no Brasil – é usado no mundo todo como suporte por muitas companhias e tornou-se tema de intermináveis debates nos círculos empresariais quando, em novembro do ano passado, a discussão chegou até o Tribunal Superior do Trabalho (TST).

Em 2011, o Brasil já contava com mais de dez milhões de trabalhadores terceirizados, segundo dados da Assertem (Associação Brasileira das Empresas de Serviços Terceirizáveis e de Trabalho Temporário). Apesar do crescimento exponencial das atividades terceirizadas, ainda não existe um marco regulatório para o setor. Por isso, as discussões e tentativas de balizar a questão estão sempre envoltas em dúvidas e muitos argumentos distintos. Tradicionalmente, a súmula 331 do TST era utilizada pelos magistrados como guia para tomar decisões que tangiam à terceirização. Basicamente, libera a prática no País apenas nas chamadas atividades-meio das empresas, ou seja, tarefas acessórias como limpeza e segurança. O grande sustou veio com a decisão que afetava a empresa Claro; o TST decidiu, em 29 de novembro de 2012, que o serviço de atendimento ao consumidor da companhia telefônica era uma atividade-fim; estava diretamente ligada ao negócio principal da empresa e, por isso, não poderia ser terceirizada. Segundo o ministro José Roberto Freire Pimenta, isso “acabaria por permitir que essas empresas desenvolvessem sua atividade empresarial sem ter em seus quadros nenhum empregado e, sim, apenas trabalhadores terceirizados”.

A decisão trouxe inquietação a contratantes e contratados. Enquanto as fornecedoras alegam que a especialização traz mais qualidade ao serviço prestado e mais competitividade às organizações, as contratantes afirmam que a internalização das operações trariam prejuízos econômicos incalculáveis, que teriam de ser repassados ao consumidor no preço final dos produtos.

A ausência de um marco regulatório levou a polêmica ao Congresso Nacional, no qual pipocam propostas que pretendem oferecer diretrizes à prática. As mais famosas são as de autoria dos deputados Vicente Paulo da Silva, o Vicentinho, do PT, e de Sandro Mabel, do PR.

Segundo o deputado petista, o Projeto de Lei nº 1.621/2007 não proíbe a terceirização, mas regula as relações trabalhistas e aumenta a qualidade do produto e serviço. “A proposta não prevê a proibição da terceirização. Dentre outros pontos, apenas limita que ela não poderá ser praticada na atividade-fim da empresa, em que os serviços exigem mais técnica e especialização, com facilidade de supervisão e controle de qualidade do serviço ou produto”, explica Vicentinho.

As empresas que utilizam serviços terceirizados alegam que, se aprovado, o projeto de lei traria desemprego em massa e aumento dos custos, que teria de ser repassado ao consumidor. A internalização da operação de atendimento exigiria mais espaço físico, mais equipamentos e investimento em treinamento – o que uma empresa especializada no assunto consegue fazer em larga escala e, portanto, com preços menores. Confrontado com esses dados, Vicentinho afirma que “jamais haveria desemprego com a aprovação da proposta. Apenas mais proteção para os trabalhadores, uma vez que o projeto não interrompe o fenômeno da terceirização e nem cria mais encargos ou impostos para as empresas”.

Além do projeto do parlamentar petista, outras propostas sobre a regulamentação das atividades terceirizadas tramitam no Congresso. Uma delas é a do deputado Sandro Mabel (PR-GO). O PL nº 4330/04 defende a responsabilidade subsidiária a favor da regra mista. A responsabilidade seria subsidiária quando a contratante comprovasse a fiscalização dos encargos trabalhistas e solidária nos casos de omissão. Assim, a contratante também teria obrigações trabalhistas sobre o pessoal terceirizado, mas não haveria nenhuma forma de veto ou limitação da terceirização de atividades de qualquer natureza.

Vítor Andrade, presidente eleito da Abrarec (Associação Brasileira das Relações Empresa–Cliente), explica que não há um marco legal para a terceirização, tampouco um conceito reconhecido sobre o que é atividade-fim, atividade-meio e atividade-inerente; por isso, qualquer interpretação equivocada pode gerar grandes transtornos às empresas. Mesmo assim, ele se baseia na lei para opinar sobre o assunto: “Tanto a Lei Geral de Telecomunicações quanto a Lei Geral de Concessões Públicas têm dispositivos expressos que permitem que as empresas contratem serviços de terceiros para desenvolvimento de atividades inerentes, acessórias ou complementares ao serviço prestado. Não bastasse todo o ganho econômico que a terceirização possa gerar, o setor de telecomunicações e os serviços públicos concedidos têm uma disposição de lei expressa que permite a terceirização das atividades inerentes”, explica. Andrade diz que as atividades terceirizadas só têm a ganhar com o conhecimento especializado que as prestadoras de serviço podem oferecer, além de gerarem mais empregos formais.

No Brasil, é comum a prática da terceirização das centrais de atendimento ao consumidor. A Atento, uma das maiores players da área, tem mais de 85 mil funcionários somente no Brasil, e cerca de 155 mil em todo o mundo. Desde o início das atividades em território nacional, em 1999, mais de um milhão de profissionais já passou pela Atento. O tamanho das operações e dos investimentos – média de R$ 150 milhões ao ano –  dá a dimensão do setor e dos possíveis efeitos da limitação da terceirização na economia brasileira. “Não só nos países da América Latina, onde isso é muito mais evidente, mas também na Europa e nos EUA a taxa de crescimento do nosso setor ainda se mantém acima do crescimento da economia, devido ao aumento da taxa de outsourcing. As empresas cada dia mais buscam a terceirização como forma de manter ou de aumentar a competitividade. E existem várias multinacionais desse setor investindo no País. É claro que esse tipo de coisa [a limitação ou impedimento da terceirização] inibe a entrada de novas empresas e causaria até a saída das que já estão aqui”, justifica Régis Noronha, diretor-executivo de estratégia e marketing da Atento.

Papel social

As fornecedoras de serviços terceirizados afirmam que a contribuição para a sociedade vai além dos fatores econômicos. As empresas que oferecem soluções para atendimento ao consumidor, por exemplo, são reconhecidas como provedoras de primeiro emprego. Cada novo funcionário é capacitado dentro da própria empresa, com cursos de informática, português e argumentação. Muitas vezes, essas operações são a porta de entrada para o mercado de trabalho, principalmente para a população menos escolarizada e de baixa renda. Com um plano de carreira interna, não são raras as histórias de supervisores, gerentes e superintendentes que começaram dentro da empresa como teleatendentes.  Hoje, na Contax, 90% dos supervisores vêm dos quadros da companhia.

No contexto global, a proposta que proíbe a terceirização na atividade-fim não parece viável, de acordo com José Américo Leite Filho, diretor jurídico do SindiTeleBrasil – Sindicato Nacional das Empresas de Telefonia e de Serviços Móvel Celular e Pessoal. “Qualquer projeto que venha a regulamentar a terceirização tem de trazer proteção aos trabalhadores e viabilidade para que as empresas possam atuar, gerar empregos e atrair investimentos é bem-vindo. Mas eu não acredito que esse projeto seja aprovado. Existem projetos de lei no Congresso muito mais próximos de serem aprovados que regulamentam sem impedir que a terceirização aconteça. Contact center é um segmento econômico próprio. Assim como aconteceu no Brasil, aconteceu no mundo inteiro, a partir do desenvolvimento de tecnologia, o modelo se desenvolveu no mundo. Pensar que o setor de contact center poderia deixar de existir por aqui? O Brasil seria o único país do mundo com uma situação como essa. Não acredito que o País fará esse tipo de opção”, diz o diretor.

Os ganhos vão além: por ano, a Contax investe cerca de R$ 200 milhões em tecnologia e atualmente passa pelo processo de implantação do nível dois de governança da Bovespa – nesse estágio, a empresa está comprometida com transparência total e com todas as regras do Novo Mercado. Marco Schroeder, diretor de finanças e relações com investidores da Contax, concorda com a necessidade da implantação de um marco regulatório, sem radicalismos: “A questão de existir um arcabouço até para proteger o capitalista que precisa continuar investindo – porque a segurança é ruim – e para melhorar as garantias dos próprios empregados. A proposta do Sandro Mabel foi uma costura, uma coletânea de alguns projetos e, inclusive protege a questão do trabalhador, que versa sobre a responsabilidade do contratante. A gente acha que realmente houve uma evolução; não é o projeto dos sonhos das empresas, é um projeto que leva em consideração todos os lados.”

Dustin Pozzetti, diretor de Telecom da PwC Brasil, compartilha da opinião de Schroeder. “A maioria das centrais de atendimento é terceirizada e eu acredito que existe um contrato com boa estrutura bem definida, que não influencia na qualidade”. O único gargalo que poderia ser enfrentado pelas empresas contratantes, nesse contexto, seria a adição de muitos outros clientes na   mesma estrutura em casos que a operadora tenha uma perda de informações sigilosas. O ideal – segundo o sócio da PwC – é se aproximar de uma empresa para garantir qualidade nos resultados.

As principais empresas de contact center têm investido pesadamente na otimização da gestão e no bem-estar dos funcionários; algumas delas chegam a alcançar níveis mais elevados do que as empresas contratantes. Investem, inclusive, nos quesitos necessários para receberem certificações ISO e de melhor lugar para se trabalhar. As maiores do setor já foram certificadas.

A terceirização é tendência mundial e de difícil reversão, se considerarmos que as maiores marcas do mundo − como Nike, Apple e Coca-Cola − também utilizam a prática em quase todos os seus processos, preocupando-se apenas com a atividade mais estratégica do negócio. “Daqui a pouco a gente está discutindo até porque a companhia telefônica não produz o cabo do telefone, porque não tem nada mais importante do que levar o sinal. Cada um tem de se concentrar no que faz melhor. Se tem alguém que presta o serviço com mais eficiência e qualidade – que, acredito, é o nosso caso-, é natural que as empresas prefriram terceirizar o atendimento”, conclui Marco Schroeder, da Contax.

Carlos Louro, presidente da Wittel, também é a favor da terceirização, mas faz uma ressalva com relação aos atuais contratos. “Chegamos quase ao fundo do poço com os baixos valores pagos pela terceirização. Fora isso, não vejo razão para a internalização, porque muitos serviços podem ser realizados por terceiros, sem problema algum”, diz.

A experiência da GVT se consolida na direção oposta. Toda a operação de contact center da companhia é realizada por funcionários, um total de quatro mil pessoas ou 25% da força de trabalho.  Edison Kinoshita, vice-presidente de operações da GVT, ressalta que ter o serviço realizado internamente traz a vantagem do maior engajamento dos atendentes. “Temos de desenvolver o tripé tecnologia, pessoas e processos. As pessoas são a linha mestra e tê-las dentro da estrutura da empresa é importante. A remuneração tende a ser maior, então são mais valorizados”.  A GVT pretende investir R$ 2,6 bilhões em 2013 em infraestrutura. Em dez Estados e mais o Distrito Federal, são oito milhões de clientes.

Empresas tomadoras do serviço ainda estudam os possíveis impactos da internalização dos serviços. Atualmente, a Claro conta com quatro empresas de contact center, sete sites terceiros e dois próprios. A estratégia da empresa foi direcionada para o trabalho com parceiros especializados em atendimento ao cliente e administração de grande volume de funcionários. A Claro ainda não efetuou um estudo conclusivo sobre a internalização.

“Quem deve julgar se a terceirização é adequada ou não é a empresa que pretende terceirizar.  A polêmica sobre regulamentação e proibição de terceirização em determinados setores deve ser resolvida o mais rápido possível. Atualmente, estamos na pior situação, que é a de incerteza jurídica”, diz Luiz Fernando Teixeira Scheliga, diretor de operações da Algar. Para ele, a decisão de terceirizar ou não deve ser de exclusividade da empresa, que deve analisar a natureza de negócio e o melhor modus operandi.

Para o presidente da AeC, Alexandre Moreira, não é possível generalizar a situação da terceirização a partir de decisões isoladas do TST envolvendo casos pontuais entre a operadora e a prestadora de serviços. “A AeC e demais empresas que atuam especificamente como prestadoras de serviços de central de atendimento estão cobertas pela Lei Geral de Telecomunicações (LGT), que autoriza a terceirização em todos os níveis para empresas de Telecom. Isso é necessário porque é muito fácil fazer confusão entre as atividades de telecomunicação e de teleatendimento.”

O crescimento do setor da terceirização das centrais de atendimento ao consumidor está estritamente associado aos avanços e às conquistas na legislação de defesa do consumidor, que tem dois grandes marcos: o Código de Defesa do Consumidor, de 1991 e a Lei do SAC (Serviço de Atendimento) de 2008. Ambos trouxeram mais parâmetros e aumentaram a exigência na qualidade do atendimento, impulsionando a contratação de serviços especializados. Em todos os setores, permeando diversas etapas da produção ou prestação de serviço, a terceirização é uma realidade mundial em grande escala. Balizar a contratação pode trazer ganhos, mas tentar mudar a situação já instalada pode trazer prejuízos da mesma proporção. A questão é delicada, polêmica e envolve diversos setores e interesses. É urgente, entretanto, que a questão seja resolvida para que a economia e a sociedade brasileira não sejam prejudicadas.

CADASTRE-SE no Blog Televendas & Cobrança e receba semanalmente por e-mail nosso Newsletter com os principais artigos, vagas, notícias do mercado, além de concorrer a prêmios mensais. 

Este artigo está disponível no endereço:

https://www.televendasecobranca.com.br/noticias/o-mosaico-da-terceirizacao-18865/
Cadastre-se agora e receba em seu e-mail:
  • Notícias e novidades do segmento de contact center;
  • Vagas em aberto das principais empresas de Atendimento ao Cliente;
  • Artigos exclusivos sobre Televendas & Cobrança assinados pelos principais executivos do mercado;
  • Promoções, Sorteios e muito mais.
Preencha o campo abaixo e fique por dentro das novidades: