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02 de dezembro de 2025 - 17:11

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Encontro de fim de ano da Febraban foi marcado por alívio pelo desfecho e discussões sobre riscos à frente

Só se falou em Banco Master no tradicional almoço de fim de ano da Federação Brasileira dos Bancos (Febraban). A política fiscal e as eleições, que dominaram algumas das edições anteriores, foram deixadas de lado desta vez. Havia uma sensação de alívio com o desfecho do caso e a percepção de que o setor financeiro novamente se mostrou resiliente, mas também não faltaram críticas ao modelo de distribuição que permitiu que o banco de Daniel Vorcaro — preso há uma semana — crescesse tanto.

Em rodas de executivos, os comentários passavam pela expansão vertiginosa do Master, há muito criticada pelas instituições financeiras, e iam até os investimentos duvidosos feitos por ele e a descoberta de carteiras de créditos supostamente fabricadas. Vorcaro tornou-se personagem de um encontro do qual nunca participou desde que comprou o antigo banco Máxima, em 2016, e iniciou sua trajetória vertiginosa. Porém, dada a delicadeza do caso, os banqueiros evitavam falar abertamente sobre o assunto com jornalistas.

Coube ao presidente do Banco Central (BC), Gabriel Galípolo, que discursou no evento, tocar na questão de forma um pouco mais aberta. Segundo ele, a autoridade monetária, neste ano, teve de lidar com questões de segurança — em referência a uma série de ataques hacker — e também com desafios relacionados à estabilidade financeira. “O BC seguiu o gabarito e cumpriu exatamente o que é a norma e regimento legal”, disse, sem mencionar o nome do Master, mas destacando o papel “competente” da equipe do órgão. “O MP [Ministério Público] cumpriu todo o rito legal, a PF [Polícia Federal] e o Judiciário. É muito gratificante estar dentro do Estado e ver as instituições funcionando como devem.”

O Banco Central determinou na terça-feira da semana passada a liquidação extrajudicial do Master, a maior já realizada em uma instituição financeira no país.

Anfitrião do almoço, o presidente da Febraban, Isaac Sidney, mencionou a necessidade de equilíbrio entre inovação e regulação — neste ano, além do caso Master, o setor lidou com uma série de ataques hacker, que na visão dos bancos tem relação com as regras mais brandas aplicadas a fintechs. Em discurso já na reta final do evento, ele disse que a dinâmica regulatória do setor bancário tem de ser ao mesmo tempo rigorosa e flexível. Para ele, inovação é importante, mas só se sustenta quando há solidez e ética. “Neste momento, precisamos muito de rigor”, afirmou.

Em diversos momentos, Sidney usou as palavras “integridade” e “solidez”, ressaltando que, “pela lente do BC”, é possível enxergar quem está ou não fazendo o que a lei exige. E fez uma declaração que, na visão de muitos dos presentes, foi uma crítica velada ao ex-presidente do Banco Central Roberto Campos Neto. Ao lado do atual mandatário do BC, que discursara minutos antes, o presidente da Febraban disse: “Galípolo conseguiu elevar a régua da dignidade institucional do BC”.

Houve críticas mais explícitas a Campos Neto, hoje vice-chairman do Nubank, já que foi na gestão dele que o banco de Vorcaro teve sua maior expansão, apesar de alertas feitos pelas instituições financeiras e pelo Fundo Garantidor de Créditos (FGC). Para um banqueiro, que falou sob a condição de anonimato, o caso Master é uma das “manchas” da gestão de Campos Neto. A outra, disse, foi ter deixado a Selic cair a 2% ao ano (nível considerado excessivamente baixo e que precisou ser revertido).

“Acho que as manifestações do Galípolo e Isaac sobre a integridade do sistema definem o sentimento do mercado”, disse outra fonte ao Valor. “É importante a defesa da boa regulação e de padrões legais e éticos.”

A situação do Banco de Brasília (BRB) também foi discutida. Era unânime a visão de que comprar R$ 12 bilhões em carteiras de crédito do Master — ainda que não fossem fraudulentas — era muita coisa para uma instituição do porte do banco distrital, um movimento que seria visto pelo BC mais cedo ou mais tarde. Paulo Henrique Costa, afastado da presidência do BRB, já participou em anos anteriores do almoço do Febraban.

A conclusão de banqueiros ouvidos pelo Valor é a de que, se o caso Master serviu para mostrar que o sistema bancário é sólido, também deixou lições. Segundo uma fonte, o setor mudou muito nos últimos anos, com a ascensão das plataformas de investimento, e talvez as regras do BC não tenham evoluído na mesma velocidade. Vários interlocutores defenderam a necessidade de que sejam respensadas as responsabilidades dos distribuidores, que ao ajudar a colocar no mercado dezenas de bilhões em dívidas de bancos médios, elevam o risco sistêmico.

No caso do Master, as plataformas distribuíam os CDBs emitidos pelo banco, que contam com cobertura do FGC, no valor de até R$ 250 mil aplicados por CPF. Agora, caberá ao fundo garantidor honrar R$ 41 bilhões em títulos.

Uma das fontes destacou que as corretoras ganham taxas elevadas para distribuir os CDBs mais arriscados, e que há incentivos para que um problema como o do Master se repita, pois não há nenhuma limitação para as plataformas. Mais de um executivo apontou que, daqui a algumas semanas o FGC vai honrar quase R$ 41 bilhões em depósitos do Master e já existem plataformas atraindo esses clientes, inclusive sugerindo investimentos em outros títulos de bancos médios com taxas elevadas.

Em relação às mudanças que o caso deve trazer, a leitura de alguns executivos é que haja ajustes nas regras do FGC em relação ao tipo de ativos em que os bancos podem investir ao captar recursos garantidos pelo fundo. O Banco Central concluiu neste mês a tomada de subsídios para uma regra que cria um indicador de liquidez de curto prazo simplificado (LCRS), que poderia ser usado eventualmente pelo FGC.

Outro ponto que tem suscitado debate é como será feita a recomposição do caixa do FGC após o pagamentos dos R$ 41 bilhões em CDBs do Master. Como o Valor mostrou, as regras do fundo dizem que podem ser adotadas medidas extraordinárias, como alíquotas adicionais e mesmo pedir que os bancos associados adiantem o equivalente a cinco anos de contribuição. Entretanto, a percepção no setor é que essa chamada de capital pode ser muito grande para alguns e que não haveria necessidade de o fundo refazer sua liquidez tão rapidamente assim, já que mesmo após o caso, ainda vai manter dois terços do seu caixa, ou seja, ou perto de R$ 81 bilhões.

Outro argumento a favor de uma recomposição gradual é que, como lembrou um executivo, uma capitalização muito rápida acabaria sendo repassada pelos bancos aos clientes, na forma de spread. Isso em um momento em que a política monetária já está bastante restritiva.

Por isso, há também quem defenda uma certa composição com o BC. Ou seja, se o conselho do FGC e o Conselho Monetário Nacional aprovarem a recomposição do caixa e, eventualmente mudanças nas regras do fundo, o Banco Central poderia entrar com alguma forma de compensação. Uma das possibilidades aventadas é uma redução temporária do compulsório que precisa ser recolhido pelos bancos.

Algo parecido foi feito em 2008, na crise financeira global, quando a circular 3416 permitiu que o cumprimento da exigibilidade de recolhimento compulsório poderia “ser efetuado com dedução do valor das parcelas da contribuição ordinária ao Fundo Garantidor de Créditos (FGC) [...] que voluntariamente forem antecipadas”. Ainda assim esse desconto é relativamente pequeno e beneficia mais os grandes bancos, do segmento S1.E

Se nos dois anos anteriores o almoço da Febraban serviu para o setor financeiro reforçar a cobrança sobre o rigor na política fiscal, neste ano, seja pelo foco no Master, seja pela ausência do ministro da Fazenda, Fernando Haddad (substituído pelo secretário-executivo, Dario Durigan), o assunto não esteve no centro das atenções. Galípolo até foi questionado sobre as eleições de 2026, mas disse apenas que o descasamento de mandatos entre o presidente da República e o comando do BC permite ao regulador exercer sua função independentemente do que está acontecendo no processo político.

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