
À frente de associação de bancos médios e pequenos, Vilain diz que mudanças nas regras do fundo pós-Master têm de ser pensadas com calma
O Fundo Garantidor de Créditos (FGC) é um dos “maiores ativos do sistema financeiro” brasileiro, ajudou os bancos atravessar crises e tem permitido que o mercado absorva a quebra do Banco Master sem grande estresse. Por isso, é preciso calma ao se pensar em mudanças nas regras desse mecanismo, diz Leandro Vilain, presidente da Associação Brasileira de Bancos (ABBC).
Segundo ele, é possível aprimorar as regras do fundo – sobretudo em relação aos ativos, ou seja, ao uso, pelos bancos, dos recursos captados. No entanto, diz, há que se “preservar o FGC” e “não mudar as regras no meio do caminho”.
Para Vilain, mudanças açodadas podem prejudicar o cliente e criar instabilidade. “Não podemos voltar ao que era [o mercado] nos anos 1980”, afirma, em entrevista ao Valor.
Discussões sobre o modelo do FGC existem há algum tempo, mas ganharam força desde a semana passada com a decretação, pelo Banco Central (BC), da liquidação extrajudicial do Master e a prisão preventiva de seu controlador, Daniel Vorcaro, sob acusação de fraude. Entre as ideias que começaram a circular estão, por exemplo, limitar a garantia do fundo ao pagamento do principal (e não dos rendimentos) dos títulos cobertos ou obrigar o investidor a levar o papel até o vencimento para ter direito ao seguro.
“Talvez pudesse se pensar em um aumento da contribuição com base no risco, talvez usando o LCR e o LCRS”
Há quem defenda que as plataformas de investimento – que distribuem os certificados de depósitos bancários (CDBs), muitas vezes usando como marketing a cobertura do FGC – também tenham que contribuir de alguma forma.
A questão é que o fundo garantidor, criado em 1995, tornou-se peça-chave no modelo de bancos pequenos e médios, representados pela ABBC. O seguro de depósito, somado à digitalização dos serviços bancários e à popularização das plataformas, mudou a lógica da captação.
Antes, bancos pequenos e médios, que atendiam sobretudo empresas e não tinham rede de agências, captavam recursos principamente de investidores institucionais. Pagavam mais caro do que os bancos grandes, que tomam depósitos de pessoas físicas e têm um funding mais diversificado. Ainda é assim, mas essa diferença se estreitou, em parte por causa do FGC. Enquanto o custo de captação dos bancos menores caiu, o dos maiores aumentou. “O FGC teve um papel nesse processo, ainda que ele não tenha a finalidade de fomentar a competição”, afirma Vilain.
Os grandes bancos alegam que, além de ter aumentado o custo, essa lógica criou distorções no mercado – por exemplo, permitindo que instituições com perfil muito arriscado, como o Master, crescessem de forma exponencial emitindo CDBs com taxas muito acima da média. Eles também argumentam que ficarão com grande parte da conta deixada por Vorcaro. O Master tem R$ 41 bilhões em depósitos que deverão ser cobertos pelo FGC. O fundo é uma associação mantida pelos bancos, e a contribuição deles é proporcional ao volume de depósitos que cada um tem.
O presidente da ABBC reconhece que o peso maior ficará com as grandes instituições, mas pondera que a cobertura existe principalmente para garantir a estabilidade em casos também grandes. “Os pequenos não têm muito impacto”, afirma.
O Conselho Monetário Nacional (CMN) já promoveu duas rodadas de ajustes nas regras do FGC nos últimos anos – a mais recente, em agosto. Ambas procuraram mitigar riscos que ficaram evidentes com o Master. O objetivo é limitar a capacidade de os bancos se alavancarem ancorados nas captações feitas com garantia do fundo.
Agora, uma das questões é se deveria haver mais restrições no passivo ou se é preciso regulamentar o lado dos ativos – ou seja, onde os bancos deveriam aplicar o dinheiro dos clientes coberto pelo FGC. Afinal, por trás da quebra do Master está o fato de que Vorcaro usou recursos dos CDBs e não aplicou em crédito, como os bancos costumam fazer, mas em ativos arriscados ou de baixa liquidez, como participações em empresas problemáticas e precatórios.
Na visão de Vilain, olhar para a qualidade dos ativos é um caminho, que já está sendo percorrido pelo BC com a discussão sobre o aumento do escopo do indicador Liquidez de Curto Prazo (LCR) – já exigido dos grandes bancos – para um grupo maior de instituições; e sobre a criação do LCR Simplificado (LCRS) para bancos menores. O objetivo da medida é aumentar a capacidade das instituições de manter ativos líquidos e de qualidade para fazer frente às saídas de caixa.
“Talvez pudesse se pensar em um aumento da contribuição [dos bancos no FGC] com base no risco, talvez usando o LCR e o LCRS. Essa é uma discussão boa”, diz o presidente da ABBC.
Vilain rechaça a ideia de que as plataformas tenham de arcar com parte dos custos, embora considere importante haver melhorias na forma como os produtos são vendidos. “Ninguém é contra haver mais transparência nas informações dadas aos clientes na hora de investir, mas colocar um pedaço desse custo nas plataformas só vai empurrar esse cliente para o mercado ilegal de recomendações, que já está aí nas redes sociais.”
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