Economistas e dirigentes de entidades lojistas afirmam que gaúchos estão mais conscientes na hora de comprar
Por: Adriana Lampert
Os gaúchos estão zelando mais por um nome limpo no mercado. Segundo pesquisas que mensuram a expansão da inadimplência, o crescimento de dívidas não pagas no Rio Grande do Sul se mantém menor do que no restante do País. O último levantamento mensal do SPC Brasil, por exemplo, aponta que o volume de pessoas no Estado que deixaram de pagar suas contas em março deste ano cresceu 3,44% frente ao mesmo período de 2014, enquanto em todo o País o aumento foi de 3,76%. Outro levantamento, realizado pela Boa Vista SCPC (Serviço Central de Proteção ao Crédito) mostra que a inadimplência em Porto Alegre subiu 2,1% em abril de 2015, na comparação com o mês anterior. Já em relação ao mês de abril de 2014, o não pagamento de débitos na Capital diminuiu em 6,6%. Na variação acumulada em 12 meses, o indicador caiu 1,3%.
Segundo os dados apurados pela Serasa Experian, atualmente, existem 55 milhões de pessoas inadimplentes em todo o território nacional. No final do ano passado, por exemplo, 25,3% da população de Porto Alegre e 22,4% dos moradores da região Sul do Brasil (Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná) estavam negativados, conforme o Mapa da Inadimplência desenhado pela instituição. Ainda assim, os percentuais são menores do que os registrados no restante do Brasil.
Os maiores índices são da região Norte (31,1%), seguida pelo Centro-Oeste (26,4%), Sudeste (24,5%) e Nordeste (23,6%). Já as capitais com maior taxa de inadimplência são Manaus, com 38,1%; Porto Velho, com 37,2%, e Macapá, com 36,4%. No estudo, ainda foram avaliadas dívidas atrasadas em mais de 90 dias e com valores acima de R$ 200,00. Porto Alegre também se saiu bem no ranking de recuperação de crédito em abril frente a março deste ano, com crescimento de 12,4%, e em comparação ao mesmo período de 2014 (7,9%).
Também no cadastro da Boa Vista/SCPC, a região Sul é a menos inadimplente. Em abril de 2015, a taxa de devedores nos estados de Santa Catarina, Paraná e Rio Grande do Sul foi de 2,66%, contra 4,28% no Norte; 4,22% no Nordeste, 3,69% no Sudeste, e 2,92% no Centro-Oeste. “Em toda a série histórica, a região Sul é sempre a de menor incidência de população devedora”, afirma o economista da instituição, Flávio Calife. “O Sul é uma região que tem mais acesso à informação, tem tradição mais austera e equilibrada, o que justifica estes índices”, comenta.
No entanto, a baixa perspectiva de crescimento de PIB, as altas na taxa de juros, que regem o volume de crédito, a inflação, que não deve baixar de 8%, e o mercado de trabalho dão sinais do desaquecimento econômico gerando saldo negativo, que merece atenção, pondera o economista da Câmara de Dirigentes Lojistas de Porto Alegre (CDL-POA), Victor Sant’Ana. Ele adverte que, mesmo com uma pressão de melhora da inadimplência no Estado e na Capital, é preciso lembrar que aumentou o número de pessoas que não têm quitado suas dívidas nos últimos anos, enquanto o volume de nomes que saem do cadastro negativo está crescendo de forma mais lenta. “Desde meados de 2013, tem ocorrido aumento da inadimplência na Capital, mesmo que esta taxa tenha perdido força nos últimos dois meses”, aponta Sant’Ana. Ele observa que, em paralelo, os indicadores de confiança dos consumidores têm permanecido pessimistas.
Só comprar o que for necessário, pesquisar preços e aproveitar ofertas são iniciativas fundamentais para baixar gastos em cenário de desaceleração econômica, ensina o especialista no mercado de recuperação de crédito e diretor de Novos Negócios da PH3A, Marcelo Monteiro. “Não é mágica: precisa mesmo é de disciplina.” Ele destaca que no caso dos gaúchos, parte da população já entendeu o recado. “O Rio Grande do Sul é mais rico e bem preparado, com melhor nível educacional, o que facilita o entendimento”, opina.
Índice de emprego ajuda a mitigar aumento de negativados
Para o presidente da Federação das Câmaras de Dirigentes Lojistas (FCDL) do Rio Grande do Sul, Vitor Augusto Koch, o aumento da inadimplência no Estado foi mitigado pelo fato de o emprego ter registrado melhor desempenho em março de 2015, com a geração líquida de 12.240 novas vagas. “Com mais pessoas contando com renda fixa, foi possível adquirir crédito e ajudar nas despesas da família. Por outro lado, a elevação da taxa de juros, especialmente no âmbito do cheque especial e rotativo do cartão de crédito, pressionou o aumento do número de dívidas em atraso”, destaca o dirigente.
Mesmo assim, o Estado registra melhora no perfil de consumidores “conscientes e parcimoniosos”, destaca o especialista no mercado de recuperação de crédito, Marcelo Monteiro. “Boa parte da população teve conquistas nos últimos anos, e não quer perdê-las. Os resultados são sinais de que as pessoas aprenderam a lidar com o novo cenário econômico”, defende.
Atualmente, o Rio Grande do Sul conta com 13,1% da população negativada, sendo que – deste montante – a maior parte de endividados que não honraram suas dívidas nos últimos 90 dias (14,9%) está na Região Metropolitana, pondera o presidente da Associação Gaúcha para o Desenvolvimento do Varejo (AGV), Vilson Noer. “Não é uma inadimplência fora de controle”, avalia o dirigente. Ele destaca que no cenário de inflação alta, restrição ao crédito e desemprego acentuado, “não há dúvidas” de que os gaúchos estão mais conscientes na hora de comprar.
Monteiro considera que o descontrole maior ocorre por parte dos jovens com idade entre 16 e 20 anos. “Chama a atenção que 40% das pessoas neste perfil estejam inadimplentes no Rio Grande do Sul”, observa. “A média do País é de 23%, dos 18 aos 24 anos”, compara. Também as pessoas acima de 65 anos estão muito endividadas, ressalta o especialista. “Esta é uma fase da vida onde já se saiu do pico de despesa, o que talvez represente que os mais velhos estão tendo que mitigar problemas de outros integrantes da família”, avalia. Já o presidente da FCDL afirma que a concentração do endividamento no Rio Grande do Sul ocorre entre os desempregados. “É a fatia com mais contas em atraso”, garante.
De qualquer forma, os consumidores mostram que estão aprendendo a puxar o freio, destaca Monteiro. “Vide as vendas do varejo: o Natal e o Dia das Mães já não foram grande coisa, a busca por destinos internacionais no turismo foi substituída por roteiros nacionais, e há migração maior de pessoas em busca de crédito consignado. Tudo isso é reflexo de aprendizado, as pessoas estão realmente enxugando gastos e buscando limpar o nome na praça.”
Móveis estão entre os produtos que mais afetam as dívidas não pagas
No ranking de setores com maiores dificuldades em receber em dia os valores das parcelas criadas pelos consumidores na hora da compra, estão os móveis e eletrodomésticos, vestuários e calçados, enumera o economista da Boa Vista SCPC, Flávio Calife.
Na pesquisa de percentual de inadimplentes por segmento, em Porto Alegre, no mês de março, os serviços mais afetados por quem não honrou com seus débitos foram os de segurança comercial (37,1%), financeiras e operadoras de crédito (20,8%), material de construção e ferragens (19%) e cosméticos e perfumarias (17,7%). Já à inadimplência na compra de móveis, no mesmo período, e artigos para casa foi de 17,4%.
Neste contexto, Calife observa que a queda no crescimento da inadimplência registrada em estados como o Rio Grande do Sul reflete ainda mais o movimento fraco do comércio e da economia do País do que, propriamente, a capacidade de pagamento das famílias brasileiras.
“A alimentação está cara, assim como houve um aumento nas contas de luz e de água. Por isso, é muito importante ter um controle do orçamento familiar a longo prazo, além de evitar o uso de crédito”, aconselha Calife.
No caso daqueles que precisarem de empréstimos para comprar ou quitar as dívidas, o economista da Boa Vista orienta: “Fuja do cheque especial ou do cartão de crédito rotativo, que são as ferramentas com os juros mais altos no mercado”.
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