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O absenteísmo tem cura?

por: Afonso Bazolli
em: Gestão
fonte: RH.com.br
23 de outubro de 2013 - 18:00

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Por: Patrícia Bispo

Não basta apenas contratar profissionais de talento e capacitados para agregarem valor ao negócio se, após algum tempo esses mesmos colaboradores começam a chegarem atrasados ou faltam ao expediente sem uma justa causa. O absenteísmo – ausência no ambiente de trabalho é um dos grandes vilões do dia-a-dia organizacional, pois quando um funcionário não comparece ao expediente, além de deixar de produzir pode afetar o desempenho de uma equipe inteira. Mas, afinal, quais os principais fatores que geram o absenteísmo e como o mesmo pode ser controlado na prática? Segundo Luís Sérgio Lico, mestre em filosofia das organizações e especialista em desenvolvimento profissional, existem três fatores-chaves para se compreender o absenteísmo: insatisfação do colaborador com a empresa; velocidade das mudanças e pouca maturidade profissional e psicológica. “Os profissionais devem ser respeitados, mas também oferecer a justa contrapartida ao empregador. É uma via de duas mãos, que devidamente sinalizada torna-se segura”, afirma. Em entrevista concedida ao RH.com.br, Luís Sérgio Lico dá destaque a algumas ações que podem ser consideradas profiláticas em relação ao absenteísmo e explica como a área de Recursos Humanos deve atuar nesse contexto. Confira a entrevista na íntegra e aproveite a leitura!

RH.COM.BR – As organizações sempre demonstram uma grande preocupação com o absenteísmo, pois isso afeta diretamente o negócio em seus mais variados aspectos. Quais os principais fatores que contribuem para a ausência dos profissionais do ambiente de trabalho?

Luis Sérgio Lico – Num mercado em que se compete agressivamente, não deveria causar surpresa a falta de lealdade com cargos e organizações. Assim, como em sociedades que não prezam a educação cívica, há falta crônica de responsabilidade. Há algo neste modelo que precisa ser modificado. Naturalmente não se pode apontar a fórmula do sucesso, nem atribuir tudo ao DNA folião e cordial do brasileiro. Há outros indicadores claros. Os fatores-chaves para compreender o absenteísmo podem ser divididos, grosso modo, em três instâncias.

RH – Quais seriam essas instância, então?

Luis Sérgio Lico – A primeira instância a ser destacada é a insatisfação com a empresa, âmbito clássico que inclui: salários, benefícios, equipamentos, liderança, punições, clima, ética e principalmente, falta de oportunidades. Nunca conheci empresa que fosse “feliz” sem se preocupar com o resultado ou “rentável” sem um bom clima estabelecido. As pessoas amam as empresas quando são admitidas, depois passam a sabotá-las porque se sentem traídas e ninguém faz a conta destas perdas. Ninguém ouve suas sugestões ou críticas, não se estimula o mérito; tudo é creditado ao processo. É a raiz do desencantamento, não somente “motivacional”, mas prioritariamente relacional. Em segundo lugar vem a velocidade das mudanças. As pessoas buscam incessantemente melhorias, estimuladas pelos modelos vigentes e nichos de cultura ao qual se pertence. Isto diz respeito à busca incessante de melhoria – imanente ao indivíduo, o que faz os profissionais empenharem seu tempo em diversos projetos, desde procurar outro emprego, buscar novas qualificações, hobbies, família e acabarem tendo problemas para gerenciar estes momentos e aspirações. Cansam-se e, assim, “dão o cano” na parte que acham sem importância: a empresa. Como por aqui não se valoriza o trabalho, mas o assistencialismo, sobra para os empreendedores pagarem a conta de um discurso envelhecido. A empresa é tida como ponte e não como fim, assim como o trabalho é encarado como penalidade. Há razões históricas para isso.

RH – E qual seria o terceiro fator-chave que contribui para o absenteísmo?

Luis Sérgio Lico – Pouca maturidade profissional e psicológica. Falta educação e formação ao profissional isto, quer dizer: consciência de direitos e deveres. Cumprir um contrato de trabalho não é um favor que se faz às empresas. As organizações são a base produtiva da sociedade e é delas que vêm toda a possibilidade de progresso e prosperidade. Elas se defendem contra perdas e endurecem o jogo, generalizando normas e proibições a cada nova ocorrência. Isto previne perdas, mas tem seu lado obscuro, pois, além de não resolver o passado, vai de encontro à maturidade do profissional. Se for baixa, ele se ressente e vira um inimigo em potencial, inclusive liderando negativamente; se for alta, mesmo o profissional mais resiliente desmotiva-se diante de tantas exigências. Este aspecto pode ser resolvido se houverem líderes atentos e um bom trabalho de aquisição e recuperação de posturas.

RH – Dos fatores apresentados, qual aquele que o Sr. considera mais preocupante?

Luis Sérgio Lico – Não há uma escolha a ser feita, pois estas situações ocorrem em conjunto e sucessivamente. Há casos onde os três planos encontram-se atuando. Mas, eu diria que descontar os minutos atrasados por causa de uma greve inesperada de transporte é contraproducente, assim como ver o gerente chegando tarde e saindo cedo, sem ligar para os problemas da equipe é algo que irrita. Da mesma forma, a falta de qualificação emocional para compreender a relação de trabalho também é um fator crítico. As pessoas não se dão conta, mas não existem coisas e sim relações. Não há um ente chamado governo e, sim, relações de governabilidade, assim como não se pode apontar: ali está a organização. O que se vê é o que se vive. Não se pode culpar a empresa pela vida que se leva, mas se esforçar para melhorá-la.

RH – O Sr. acredita que o absenteísmo tem solução?

Luis Sérgio Lico – Se há uma cura para os males das organizações, estes procedimentos devem primeiro, interpretar relações. A educação, portanto, é essencial neste processo. Segundo: devem mapear ferramentas, processos e interações. Finalmente, precisam estar alinhados com as estratégias que realmente trazem vantagem competitiva. Entre elas a racionalidade das análises, clima, contexto e ações produtivas. Neste meio tempo, atender às necessidades das pessoas a partir de políticas claras, objetivos sensatos e ações sustentáveis. Dizem com razão que o combinado nunca sai caro. Como lidamos com pessoas, cabe investigar seus limites e oferecer diagnósticos. Educar pessoas não é alfabetizá-las em uma linguagem ou técnica, mas civilizá-la, dotá-la de sentido ético. Inseri-las no contexto global da entidade e não apenas em seu departamento. Construir culturas corporativas, com sistemas que mesclem atrativos e desafios é importante, mas fica restrita aos executivos. Uma maneira alternativa com impactos positivos no médio prazo seria construir comunidades dentro da empresa que se relacionam vertical e horizontalmente. Mais que benefícios, formar irmandades e fraternidades corporativas, que competem entre si pela melhor contribuição a suas bases operacionais e à organização como um todo, em modelos sustentáveis.

RH – Quais são as principais ações que podem ser consideradas profiláticas em relação ao absenteísmo?

Luis Sérgio Lico – Integração, transparência e mapeamentos sistemáticos. Todos falam de sistemas de gestão da qualidade ou conhecimento, mas poucos os aplicam convenientemente. Há também um limite para as vantagens competitivas. As empresas têm que se preocupar com os problemas de capilaridade. Toda a atenção está focada nas artérias principais da empresa e os pequenos processos são deixados de lado, pois não são considerados estratégicos. Pois bem, justamente a necrose destes tecidos periféricos, por falta de estrutura é que contamina o organismo, da periferia para o centro. A profilaxia é educar do colaborador ao CEO, do dia em que se dá o acesso até o desligamento.

RH – Qual o mecanismo mais eficaz para se identificar as causas que contribuem com a ausência do trabalho?

Luis Sérgio Lico – Sugiro o mapeamento ontológico, quer dizer, incluir no escopo das considerações não somente as métricas e as projeções analíticas, mas o campo da presença humana. Não se trata de um humanismo ou de mais um “sono antropológico”. Falo de uma quarta força, além dos processos, ferramentas e pessoas. Narro o campo das condições de possibilidades, o espaço onde podem ocorrer estas causas, que a meu ver são uma rede de configurações. Quais estímulos da organização afetam nossa rotina? Alteram os processos, nublam as regras, em que espaço as normas são insuficientes para dar conta da realidade? Qual o melhor custo: o do fazer ou do não fazer? Como acompanhar – não quocientes e totais – mas, o fluxo da indeterminação onde se anuncia o fato e, assim poder atuar eficazmente? Sabemos trabalhar e nos relacionar, quer dizer: nossas experiências nos habilitam a tanto? A academia nos preparou convenientemente? Sou nativo, imigrante, incluído ou excluído social-digital? Na era da hipercompetitividade, confessar minhas dificuldades e angústias não parecerá o sinal da fraqueza e origem do descarte? Posso negociar com a empresa? Estas problemáticas ainda não estão na pauta do dia, mas eu as vejo chegando.

RH – Esse mecanismo que o Sr. citou pode ser utilizado por qualquer organização ou há restrições?

Luis Sérgio Lico – Vai depender do grau de controle que exista. Avaliar topografias organizacionais é um exercício salutar para todos. Naturalmente, numa empresa pequena a tolerância é maior, pela falta de quadros, proximidade com o colaborador, mas não é regra. Numa grande corporação os danos com o absenteísmo serão bem maiores, em função do aumento de escala, portanto a preocupação é constante. Mas, em ambas há consenso: se a pessoa falta ou se atrasa com freqüência, por motivos fúteis é rescisão na certa. Tanto para manter, quanto para dispensar há custos e isto deve motivar as lideranças a perseverar em análises abrangentes e fugir de modelos obsoletos.

RH – Em sua experiência como consultor, quais são os principais erros que as empresas cometem ao liderem com o absenteísmo?

Luis Sérgio Lico – Não pensar que o mal é endêmico, mas localizado na pessoa. Pode-se desenvolver uma vacina, mas somente se conseguirmos manipular o vetor de transmissão. Esta medicina deve inocular a perfeita sintonia e integração entre missão da empresa e a missão pessoal, pois é o que mantém os desafios superáveis e os profissionais comprometidos. O clássico “mais por menos” da administração deve ser revisto aqui. Nada adianta forçar produtividade se o computador é velho, o filho está doente ou a cadeira está quebrada. Erra-se ao prodigalizar benefícios tanto quanto negar-se a negociar com as necessidades que se apresentam. Além do mais, elas são sazonais e têm períodos de pico, desta forma são diferenciadas e podem ser antecipadas com o mapeamento que sugeri.

RH – Por que as organizações ainda cometem esses mesmos erros?

Luis Sérgio Lico – Por hábito, superstições locais e também porque perderam o efeito capilaridade, não mais conseguindo as diretrizes e as informações atingir a organização como um todo. Há subculturas dentro da organização, solos móveis que se organizam e se desfazem. Não se trata de como as organizações erram, mas por qual bússola orientam-se. Sêneca disse que não há vento favorável para aquele que não sabe aonde vai.

RH – Quais os principais cuidados que as organizações devem ter ao “combaterem” o absenteísmo?

Luis Sérgio Lico – Resultados sustentáveis vêm de estratégias consistentes e devem alinhar, ao menos, três fatores-realização: retorno, inovação e sustentabilidade. O primeiro é o óbvio: organizações necessitam lucrar. O segundo permite obter resultados com melhores custos e isto quer dizer sobrevivência; para isso é preciso suportar o empreendedor interno e aprender com os erros. O terceiro significa produzir sem destruir; liderar sem coerção ou desrespeito e recompensar sempre o mérito. Quem quer ouvir aquele que clama no deserto? Somente os sábios inclinam-se diante das propostas éticas. Estes geralmente ganham mais em longo prazo.

RH – Que recado o Sr. deixaria para o profissional de RH que atua em uma organização onde o absenteísmo é elevado?

Luis Sérgio Lico – Que sejam empreendedores e criativos. O RH tido como estratégico não é um assento no board, mas uma complexa cadeia de gerenciamento. Deve envolver qualitativamente todos os subsistemas. Deve ser transparente e propor o desafio, ao invés de mascarar os inconvenientes. Uma vez participei de um processo seletivo que durou seis meses, com inúmeras entrevistas e dinâmicas. No final, sobramos eu e uma executiva, então o selecionador me disse que iria escolher a concorrente, porque eu não iria agüentar o ambiente. O “presidente” era pessoa irascível e melindrosa, que não aceitaria críticas ou correções a seu trabalho, ainda mais se fossem fundamentadas. Perguntei por que havia demorado seis meses para me avisar sobre a realidade e ele respondeu: porque precisava manter o nível da seleção. Não estava preocupado com o que ocorreria após a contratação, apenas em cumprir uma etapa do processo. Eis um erro: o foco estreito demais no core business. A velocidade das mudanças e a rapidez das demandas estão nos fazendo perder o entorno e nos perdermos em um mar de tarefas e retrabalhos. Se fosse eu o contratado, sairia assim que aparecesse outra oportunidade ou faltaria para ir a uma entrevista. Já a moça, pediu demissão depois de três meses. Resumo: há outros tipos de perdas que se alimentam do absenteísmo.

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1 Comentário
  1. Acredito totalmente na função piegas de que recursos humanos resolve problema! A pergunta não deveria ser “O absenteísmo tem cura?” por isso nunca vai ter um discurso de solução. O fato é que as empresas não tem cura. Quando começa o absenteísmo o empregado já descobriu a falha no sistema da empresa e já não está mais satisfeito. O fato é que o ser humano tenta de todas as formas tampar o sol com peneira e fica empurrando com a barriga um emprego que deveria ter fim no segundo dia de contratação. O dia que tiver uma empresa que contrate empresas de qualidade com eficiência e empenho para funcionar neste campo farto de trabalhadores dispostos, fornecedores de forças para mover qualquer tipo de empreendimento através de compensações financeiras justas, teremos uma discussão melhor sobre todo tipo de emprego e trabalho. Enquanto ficar neste desculpismo julgativo onde sempre aquele que não está feliz é o culpado nada vai andar neste país.

    Marília Franco de Carvalho em 24 de outubro de 2013 - 08:29

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