Mar
14

Uma aula sobre como detectar bobagens corporativas

por: Afonso Bazolli
em: Gestão
fonte: Valor Econômico
13 de março de 2019 - 18:00

Uma-aula-sobre-como-detectar-bobagens-corporativas-televendas-cobranca

Por: Lucy Kellaway

A Universidade de Washington passou a oferecer a seus alunos, no mês passado, uma nova disciplina intitulada “Calling Bullshit In the Age of Big Data” (em uma tradução livre, “Detectando Bobagens na era do Big Data”). Nas últimas duas décadas, semana após semana, venho detectando bobagens no “Financial Times” e assim fiquei muito feliz em saber que meu passatempo favorito entrou para o mundo acadêmico.

Embora essa aula esteja limitada a detectar bobagens nos números, acho que há a mesma necessidade de fazer isso com as palavras, especialmente as que são usadas no mundo dos negócios. O que se segue é um esboço de uma disciplina concorrente, voltada para preencher essa lacuna.

Ela começa com uma definição: bobagem significa coisa sem sentido, geralmente do tipo pomposa, que finge ser algo que não é. Olhos atentos perceberão rapidamente a dificuldade de se aplicar isso à vida corporativa – quase tudo se encaixa na descrição. Antes mesmo de entrar na redação do jornal me deparei com uma placa amarela de plástico alertando: “Cuidado, piso molhado” – uma besteira porque geralmente o piso não está molhado e, quando está, a ilustração de alguém caindo espetacularmente exagera o fato.

A primeira regra sobre detectar bobagens corporativas é não fazer isso com muita assiduidade, caso contrário você ficará louco. Aprendi a ignorar 95% dessas bobagens. Sobre o restante, me faço duas perguntas: a) que qualidade ela tem? e b) quão danosa ela é?

Avaliei dezenas de exemplos com que me deparei nos últimos dois dias e escolhi três que valem a pena mencionar. O primeiro é um documento de promoção de marca produzido para a nova logomarca da Pepsi em 2008 e ressuscitado na semana passada no Twitter. Ele tem diagramas que comparam os campos magnéticos da Terra aos “campos de energia da Pepsi”, e um texto que diz: “O DNA da Pepsi tem sua origem na dinâmica das oscilações de perímetro”. Nesse ponto, o documento é nota 10, uma bobagem incontestável. Mas na segunda pergunta – se ela é danosa -, a resposta é não. A Pepsi mudou sua logomarca e continuou vendendo sua água açucarada marrom ao redor do mundo indiscriminadamente.

Mesmo assim, bobagens como essa merecem ser denunciadas tanto por sua qualidade excepcional, como porque fazer isso pode levar seus perpetradores a se questionarem o que diabos estão fazendo na Terra.

O exemplo número dois é um documento da Deliveroo sobre sua linguagem preferida para descrever os pobres sujeitos que andam por aí de bicicleta com comidas mal cheirosas dos outros nas costas. O memorando elimina a palavra “funcionários”, substituindo-a por “prestadores de serviços independentes” e proíbe o uso de “pagar” e “contratar”, preferindo “faturar” e “integrar”.

No quesito qualidade, essa bobagem é fraca. “Prestador de serviço independente” e “faturar” são palavras inócuas e “integrar”, embora lastimável, é tão comum que há pouco sentido em protestar. Mas quanto ao grau de dano que pode provocar, o do memorando da Deliveroo é muito grande. A companhia sabe que se as pessoas usarem as palavras comuns “funcionário” e “contratar”, elas poderão cometer o erro de achar que têm direito a coisas como férias e auxílio-doença – que a Deliveroo obstinadamente nega a elas.

O terceiro exemplo vem de Jim Norton, que tem o cargo deliciosamente idiota de “diretor de negócios e presidente de receita” da Condé Nast. Na semana passada, ele esboçou sua nova estratégia para os funcionários da companhia em um memorando que começa com “Equipe” e prossegue com uma série de bobagens corporativas sobre cartilhas, jornadas e uma grande variedade de soluções diferenciadas. Ele menciona demissões como “duras decisões de pessoal”, para depois declarar o novo plano corporativo: o “Condé Nast One”.

Para empresas que alegam ser “únicas”, isso é bobagem padrão – um clichê e uma mentira, dado o número inevitável de interesses particulares que existem em qualquer organização. Se Norton estivesse no setor automobilístico ou no bancário, eu até poderia ter deixado isso passar. Mas a Condé Nast publica as revistas “Vanity Fair” e “The New Yorker”, nas quais os padrões editoriais são tão severos que um editor desta última já escreveu um livro inteiro baseado na colocação correta da vírgula.

Norton pode muito bem insistir na “herança do jornalismo de qualidade”, mas se ele tivesse consultado sua equipe sobre a edição de seu “grito de guerra” – “Vamos todos transitar juntos esta empresa” -, eles certamente teriam dito a ele que o verbo transitar é feio, mas como verbo transitivo é uma monstruosidade. Ele não consultou. Por isso, o que sua equipe fez foi ler o memorando, dar o assunto como encerrado e repassá-lo para mim.

CADASTRE-SE no Blog Televendas & Cobrança e receba semanalmente por e-mail nosso Newsletter com os principais artigos, vagas, notícias do mercado, além de concorrer a prêmios mensais.

» Conheça os colaboradores que fazem o Blog Televendas e Cobrança.

Gostou deste artigo? Compartilhe!

Escreva um comentário:

[fechar]
Receba as nossas novidades por e-mail:
Cadastre-se agora e receba em seu e-mail:
  • Notícias e novidades do segmento de contact center;
  • Vagas em aberto das principais empresas de Atendimento ao Cliente;
  • Artigos exclusivos sobre Televendas & Cobrança assinados pelos principais executivos do mercado;
  • Promoções, Sorteios e muito mais.
Preencha o campo abaixo e fique por dentro das novidades: