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14 de abril de 2020 - 17:00

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Para promover diversidade e melhorar o bem-estar dos funcionários, cada vez mais empresas derrubam as regras de vestimentas

Com 27 tatuagens e dreadlock no cabelo, ­Camila Ferrigno, de 48 anos, chama a atenção no escritório. Além do visual, sua postura é autêntica. Ela não esconde ser bissexual e fala com naturalidade sobre a opção pelo xamanismo — que busca conexão com o sagrado por meio da natureza.

Gerente de RH da Roche Diagnóstica, divisão da farmacêutica suíça que fabrica equipamentos e reagentes para análise médica, Camila ilustra uma importante transformação que vem ocorrendo no mundo corporativo.

O modelo rígido que se sustentou por décadas, com obrigatorie­dade de salto alto para as mulheres e terno e gravata para os homens, está na berlinda. O número de empresas liberando o dresscode e defendendo que as pessoas assumam seu estilo dentro das corporações só cresce.

Os códigos sobre o que usar no trabalho começaram a ser colocados em xeque na virada do século 21, quando chefes de novatas da tecnologia, como Google e Amazon, faziam os negócios crescer vertiginosamente sem abrir mão das calças jeans e camisetas. Figuras como Steve Jobs ajudaram a quebrar o padrão corporativo, dando um recado sutil de que quem vê imagem não vê talento.

De que adianta ter gente engomada, mas sem criatividade? “Aos poucos, questionamentos sobre a necessidade de regras para se vestir ganharam força e, hoje, estão provocando transformações em setores tão conservadores e sisudos quanto o financeiro”, diz Maria José Tonelli, professora titular no departamento de administração e recursos humanos da Fundação Getulio Vargas (FGV).

Tanto que até o gigante Goldman ­Sachs entrou na onda. No mês passado, o quinto maior banco dos Estados Unidos surpreendeu os 36 000 funcionários com um comunicado sobre o fim das exigências. A instituição foi sucinta: “Roupas casuais não são apropriadas a todas as situações. Nós confiamos em seu bom senso. Vista-se de acordo com as expectativas do cliente”.

Em terras brasileiras, o Itaú está dando o exemplo. Dez meses atrás, o banco brasileiro se desapegou do velho ranço do pretinho básico e criou a campanha “Vou como Sou”. Nela, os 86 000 empregados, incluindo os de agências, foram liberados de formalidades.

Com sabedoria, quase tudo é permitido, inclusive bermuda, tênis e sandália rasteirinha. “Até nosso presidente [Candido Botelho Bracher] tem circulado de jeans pela companhia. Uma pessoa não é mais competente porque usa salto ou gravata. Cabelo comprido ou tatuagem também são partes da identidade. Nós queremos os indivíduos por inteiro e felizes. A infelicidade não produz”, diz Andrea Pinotti, diretora de RH.

Embora seja difícil correlacionar diretamente o dresscode com produtividade, faturamento e lucro — esses resultados dependem de uma somatória de fatores —, a maior parte dos executivos de pessoas defende que permitir aos trabalhadores usar aquilo que os deixa à vontade torna o ambiente descontraído e ajuda a despertar a criatividade e a inovação, fatores essenciais para a sobrevivência dos negócios na era da disrupção.

Ao incentivar que as pessoas sejam quem realmente são, no entanto, a empresa deve orientá-las. Casos como o do Goldman Sachs, que liberou geral e apostou no bom senso, podem não dar certo. Mapear pontos críticos é fundamental para evitar mal-entendidos.

Andrea Pinotti e sua equipe, por exemplo, chamaram funcionários de todas as áreas do banco para conversas informais. A ideia era colher opiniões sobre o tema, sentir a receptividade à mudança e captar os desafios que teriam de ser superados.

A campanha foi lançada com um vídeo explicativo, e dicas de moda foram divulgadas nos canais de comunicação interna. “Depois de 20 anos de terno e gravata, muita gente tinha medo de errar. Foi pensando nelas que elaboramos esse material com sugestões de combinações”, afirma a executiva. O banco incentivou os empregados a postar selfies na intranet mostrando o novo visual.

A adesão foi tão positiva que o Itaú nem precisou prosseguir com outras ações que estavam programadas para dar sustentação ao programa. “Ao longo destes dez meses, não vi ninguém com roupa de praia ou qualquer escolha inadequada”, afirma Andrea.

De imediato, a RH afirma que o pessoal está mais relaxado — no bom sentido. “Ainda é cedo para falar em aumento da performance, até porque é difícil fazer correlação. Mas, de maneira geral, os times parecem mais descontraídos e felizes. Vamos confirmar isso futuramente em nossa pesquisa de experiência do funcionário”, diz.

Além do visual

De acordo com especialistas, a aceitação do jeito de ser não deve se restringir apenas ao guarda-roupa. É preciso abrir a mente da organização, coordenando o fim do reinado de ternos e terninhos com uma transformação da cultura organizacional. Sozinhas, novas diretrizes de etiqueta não dão conta de tornar a empresa mais moderna, ágil e flexível.

Para conseguir uma mudança que impacte verdadeiramente a forma de pensar e de fazer negócios, o primeiro passo é mexer no mindset da liderança. Se os chefes não desconstruírem o próprio imaginário, passando a aceitar a indumentária e a história de cada subordinado, a metamorfose não acontece. Isso porque um programa “vem de você” bem estruturado pressupõe acolher as diferenças.

Mais do que liberar o uso de roupas descoladas no expediente, a prática deve englobar fatores subjetivos, como personalidade, origem familiar, religião, visão de mundo e desejos. “Hoje, as pessoas querem se expressar. Se não forem ouvidas, elas vão embora, em especial as da nova geração”, diz RaïssaLumack, sócia da consultoria Blue Management Institute (BMI).

De acordo com ela, se a hierarquia for engessada, não adianta mandar as pessoas ser quem são. “Deve-se acabar com essa coisa de andar e restaurante exclusivos para diretor e de secretária ‘leão de chácara’ que inviabiliza o acesso aos executivos. Isso é do século passado.”

Na Roche Diagnóstica, o programa No DressCode foi lançado em janeiro deste ano. Mas ações para estimular a livre manifestação de ideias e sentimentos entre 350 empregados foram implantadas antes, em 2018. “A vestimenta é a primeira liberdade de expressão, mas não é a única”, analisa Henrique Vailati, diretor de RH da multinacional no Brasil.

Para colocar esse discurso em prática, a organização criou uma espécie de LinkedIn interno, no qual, além de se conectar com colegas, os empregados gerenciam a carreira, indicando o que gostariam de fazer.

Antes de ser gestora de RH, Camila, que abre a reportagem, era diretora de serviços. “Tive burnout e, quando me recuperei, decidi que não queria continuar, ainda que estivesse no comitê executivo. Para muitos, foi um passo atrás, mas quis fazer essa mudança e encontrei apoio.”

Demanda jovem

Embora o Vale do Silício seja fiador desse tipo de mudança no mundo corporativo, há outro fator importante a ser considerado: o perfil da nova geração.

Maria José Tonelli, da FGV, está concluindo uma pesquisa que mostra que os jovens não desejam mais trabalhar nas grandes multinacionais só porque elas têm uma marca forte. “Se a empresa não se encaixar no propósito deles, eles vão embora”, afirma a estudiosa.

Nesse sentido, ou as organizações flexibilizam as regras ou serão irrelevantes para os novos talentos.

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Por isso, é recomendável comunicar a ausência de trajes específicos já na fase de recrutamento, de maneira a fortalecer a marca empregadora. Na Atento, multinacional espanhola de atendimento ao cliente, segue esse conselho.

“Estamos sempre reforçando, inclusive durante a seleção, que as pessoas podem ser o que são aqui dentro. Não há nenhuma restrição, nem de gênero, nem de religião, nem no jeito de se vestir”, diz Majo Martinez, vice-presidente de RH.

As únicas restrições são chinelo de dedo e boné, ambos por questão de segurança — o primeiro para evitar possíveis acidentes e o segundo para permitir a identificação dos indivíduos. Os demais itens estão liberados, incluindo os turbantes, que voltaram à moda.

Sobre esse acessório, Majo cita um episódio curioso: recentemente, foi preciso fazer um treinamento com a equipe terceirizada de segurança, que insistia em inspecionar o adereço em busca de objetos ilícitos. “Temos um ambiente de inclusão aqui, mas isso ainda não se estende à sociedade”, analisa Majo.

A Atento tem 80 000 empregados, 1 300 deles usando crachá social, pois há transexuais, travestis, homossexuais, andróginos e quem prefere ser chamado por outro nome.

Clima familiar

O fato é que ninguém mais quer criar uma persona no escritório. Prova disso é que uma pesquisa nos Estados Unidos com 2 653 profissionais acima de 21 anos pela MetLife, seguradora americana, mostrou que seis em cada dez pessoas dizem se comportar no trabalho como se estivessem em casa.

O estudo conclui que, na era da internet, trabalho e vida pessoal se sobrepõem. Por isso, medidas que melhorem essa experiência, como a extinção das regras de vestimenta, a flexibilização do horário e a adoção de home office, serão cada vez mais importantes para engajar e manter talentos.

Raphael de Carvalho, CEO da MetLife no Brasil, é sucinto ao explicar: “Por que fazer isso? Porque é o correto a ser feito, além de bom para os negócios”. Se o profissional é competente, pouco importa a roupa que está usando.

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